No âmbito da disciplina
de Psicologia da Educação, lecionada no terceiro ano da licenciatura de
psicologia, foi me solicitado desenvolver um trabalho sobre Óscar Gonçalves.
Trabalho esse que decidi partilhar aqui no blog.
Óscar Gonçalves nasceu
em 1958 na cidade do Porto. Vinte e três anos mais tarde, em 1981, licenciou-se
em psicologia na universidade do Porto, partindo, posteriormente, para os
Estados Unidos a fim de concluir o seu doutoramento em psicoterapias e consulta
psicológica na universidade de Massachusetts. E, mais recentemente, em 2003, estudou
neurociências na Universidade de Vigo (Gonçalves, 1990; …, …; Henriques, 2011).
Iniciou a sua atividade laboral como monitor de psicofisiologia, sendo que a
sua primeira investigação incidiu na temática do sono, em 1979 (Henriques,
2011).
Óscar Gonçalves iniciou
a sua carreira como docente do ensino superior na faculdade de psicologia e
ciências da educação da Universidade do Porto, onde permaneceu até 1989.
Simultaneamente, foi professor convidado nas Universidades de Massachusetts e da
Califórnia em Santa Bárbara. Após deixar a Faculdade de psicologia e ciências
da educação do Porto, Óscar Gonçalves ingressou na Universidade do Minho, onde
foi um dos fundadores do curso de psicologia e onde permanece como docente. É
diretor de curso de psicologia e é presentemente, diretor do laboratório de
neuropsicofisiologia da mesma universidade (Gonçalves, 1990; …, …; Henriques,
2011).
Nas
décadas de oitenta e noventa, em conjunto com o professor Luís Joyce Moniz,
Óscar Gonçalves contribuiu para a divulgação do cognitivismo, do
comportamentalismo, do desenvolvimentismo bem como do construtivismo (Henriques,
2011). E segundo espelha o seu currículo, a solo ou em conjunto com outros
investigadores tem diversos artigos publicados em revistas científicas
nacionais e internacionais, bem como é autor e coautor de diversas obras
sobretudo no âmbito da teoria, prática e investigação em psicoterapia. Sendo
que atualmente a interação entre marcadores neurocognitivos e estrutura
cerebral e o seu funcionamento em perturbações desenvolvimentais, doenças
neurodegenerativas e processos psicopatológicos são o epicentro da sua
investigação (Gonçalves, 1990; Henriques, 2011). Em entrevista concedida à Sociedade
Portuguesa de Psicoterapias Construtivistas (2011),
Óscar Gonçalves considerou-se psicólogo, clínico e psicoterapeuta (Henriques,
2011).
A terapia comportamental é um dos ramos de ação de
Óscar Gonçalves concomitantemente com as neurociências e as psicoterapias
narrativas. Num olhar sobre as suas teorias no âmbito das terapias
comportamentais, percebe-se que para Óscar Gonçalves, o modelo terapêutico
comportamental revolucionou a avaliação clínica, no que às metodologias e
processos diz respeito (Gonçalves, 1990). Visto que a avaliação e conceptualização
comportamental baseia-se num processo através do qual os dados inerentes não só
à realidade mas também ao funcionamento do cliente traduzem-se em
acontecimentos “objetivos”, “observáveis” e “operacionalizados”, com vista a
clarificar as relações funcionais entre acontecimentos do meio e as
consequentes respostas do cliente (Gonçalves, 1990). Deste modo, existem quatro
parâmetros fundamentais na caraterização da avaliação e conceptualização
comportamental. O primeiro refere-se à centração nos comportamentos
observáveis, negando a utilização de rótulos diagnósticos, tais como: a
“hiperatividade”, a “preguiça” ou a “ansiedade” uma vez que um dos objetivos da
avaliação comportamental é identificar os fatores concretos inerentes à
mudança. Ainda no seguimento deste primeiro parâmetro, Óscar Gonçalves Releva
que é importante para o terapeuta comportamental saber o quê, O como e o
quando, isto é, o “o que é que o cliente faz”, “como o faz” e quando o faz”. Como
tal é necessário estabelecer, em primeiro lugar, qual o comportamento a ser
observado, para posteriormente definir o mesmo objetivamente e
operacionalmente, seguindo-se a análise topográfica, tendo em conta a ”forma”,
“frequência”, “duração” e “intensidade”. O segundo refere-se aos comportamentos
observados como amostra, significa que o comportamento analisado não é visto
como algo intrínseco, mas sim como uma amostra do funcionamento do cliente. O
terceiro diz respeito à análise das relações funcionais, cuja finalidade é
analisar os estímulos primários e os secundários de forma a reunir informação
acerca das relações funcionais intrínsecas tanto ao meio como ao comportamento.
E, finalmente, o quarto parâmetro corresponde à ligação entre avaliação e o
tratamento, isto é, após destacar a definição operacional, bem como clarificar
as relações funcionais, é possível ao
terapeuta determinar a estratégia de tratamento adequada e, simultaneamente,
monitorizar os efeitos da mesma (Gonçalves, 1990). Posto isto, segue-se a
operacionalização dos processos a utilizar. Que Segundo Explica Óscar
Gonçalves, são necessárias duas fases. A primeira diz respeito às estratégias
utilizadas para a descrição comportamental, isto é a análise E. O. R. C. Sendo
que o É. Corresponde à avaliação de estímulo, isto é, a identificação dos
estímulos recebidos que originam os comportamentos; o O. é avaliação do
organismo, ou seja, integra a avaliação genética, fisiológica e o historial de aprendizagens;
o R. à avaliação da resposta, que inclui as respostas motoras, cognitivas e
fisiológicas; e o C. corresponde à avaliação da consequência, isto é, a
avaliação das consequências que resultam dos estímulos e das respostas aos
mesmos. Quanto a segunda fase,, esta diz respeito às técnicas de formulação
comportamental, que implica traçar um mapa concetual, tendo em conta uma
microanálise e uma macroanálise. A microanálise corresponde ao estudo dos
múltiplos acontecimentos, isto é, estímulos, respostas e consequências
responsáveis por determinado problema. Quanto à macroanálise, esta diz respeito
à análise do histórico dos acontecimentos que despoletaram determinado comportamento
(Gonçalves, 1990). Quanto à entrevista de avaliação comportamental, Óscar
Gonçalves considera que a mesma deverá ser estruturada, seguindo uma linha de
orientação definida mas permitindo uma ligeira flexibilidade, sendo que a
análise do funcionamento global e a análise detalhada das disfunções do cliente
tem de ocupar o epicentro da atenção do terapeuta. Os objetivos da entrevista
de avaliação comportamental apresentam-se estruturados em seis tópicos
cruciais: “(1) a iniciação de uma relação de ajuda, estruturação do processo e
análise das espectativas do cliente; (2) avaliação do funcionamento global do
cliente e dos sistemas nos quais ele se encontra inserido; (3) a definição e
análise detalhada das várias áreas problemáticas; (4) o estabelecimento de um
diagnóstico psicopatológico; (5) a formulação de uma concetualização
comportamental dos problemas do cliente; (6) a finalização, através da
integração dos dados e da sua devolução ao cliente” (Gonçalves, 1990).
Óscar Gonçalves
defende que as técnicas terapêuticas inerentes às estratégias terapêuticas de
exposição gradual e mediatizada são constituídas, habitualmente, por três
componentes. A primeira diz respeito ao treino de relaxamento progressivo, com
vista a trabalhar com o cliente, gradualmente, as técnicas de relaxamento até
que o mesmo seja capaz de relaxar ao ouvir a ordem do terapeuta «relaxe». A
segunda refere-se à construção das hierarquias de cenas que causam ansiedade.
Esta etapa surge em simultâneo com a anterior e tem como objetivo construir uma
espécie de escala onde se encontram os elementos causadores da ansiedade,
ordenados de forma decrescente. E, finalmente, a terceira que refere-se a
apresentação imaginada da hierarquia, sendo esta emparelhada com a resposta de
relaxamento. Quer isto dizer que, nesta fase, o cliente é exposto a cada um dos
estímulos que constituem a hierarquia anteriormente traçada, transitando para o
nível seguinte apenas quando seja ultrapassada a ansiedade manifestada nos
níveis anteriores (Gonçalves, 1990). Resta
acrescentar que estas estratégias podem ser aplicadas de duas formas, ao vivo e
em grupo. Ao vivo significa que o terapeuta acompanha o cliente na exposição a
estímulos reais, sendo que a mesma é feita de forma gradual. Enquanto que em
grupo são tratados, simultaneamente, vários clientes que cujos problemas são
comuns, sendo traçada uma hierarquia comum e em que todos avançam ao ritmo do
cliente mais lento (Gonçalves, 1990).
É necessário salientar que no âmbito da terapia
comportamental, para que o cliente tenha sucesso no processo de mudança, a
aprendizagem assume um papel fulcral. Desde o início do século XX, os estudos
da aprendizagem e do comportamento caminham de mãos dadas e, ao longo do tempo
verifica-se uma evolução. Com o paradigma do condicionamento clássico,
acreditava-se que a aprendizagem se processava através da manipulação de
estímulos de forma a desencadear uma resposta previamente existente no
indivíduo. Mais tarde, com o paradigma do condicionamento operante, percebe-se
que a aprendizagem é um tanto ou quanto flexível, sendo possível adicionar
novas aprendizagens e eliminar aprendizagens anteriores e assim alterar o
comportamento. Já o paradigma da aprendizagem social transparece outra
realidade, a de que a aprendizagem surge através da observação e consequente imitação
de comportamentos, recorrendo aos processos cognitivos (Gonçalves,
1990).
Quanto à psicoterapia
narrativa, Óscar Gonçalves explica que esta surge da relação entre cliente e
terapeuta e da consequente conversação entre ambos que tem subjacente a
construção de diversos significados, visto que cruzam-se linguagens e realidades.
Assim, no âmbito da psicoterapia narrativa, o terapeuta depara-se com o desafio
de ser capaz de construir com o cliente um sentido de coerência e continuidade
narrativa, tendo em conta a sua experiência intrínseca e extrínseca à conversa
entre ambos (Fernandes e Gonçalves, 2001). Estas narrativas são cotadas pelo
terapeuta tendo em conta a sua estrutura bem como o seu conteúdo. Quanto à
estrutura, o terapeuta deverá ter em conta, em primeiro lugar, se existe ou não
narrativa. Posteriormente, deverá avaliar a coerência narrativa, baseando-se
num sistema de codificação constituído por quatro critérios: a orientação, a sequência
estrutural, comprometimento avaliativo e integração. Cada um destes parâmetros
deverá ser codificado tendo em conta o grau de presença na narrativa em
análise, utilizando para o efeito uma escala de Likert de cinco pontos. Na
cotação da estrutura não é necessário ter em conta a forma do discurso, mas sim
a sua organização (Gonçalves, Henriques & Cardoso,, 2001). No que diz
respeito ao conteúdo, o terapeuta deverá ter em atenção os seguintes quatro
parâmetros, que são considerados como sendo os organizadores centrais dos
conteúdos narrativos: as personagens, os cenários, os acontecimentos e as
temáticas. Sendo que uma narrativa que englobe diversas temáticas, onde surjam
diversas personagens, múltiplos acontecimentos e uma variedade de cenários
reflete não só uma expressão regressiva, mas também uma organização proactiva
de uma existência flexível e diversificada. Por outro lado, se na narrativa
está patente apenas um tema, uma personagem, pouca diversidade de
acontecimentos e um único cenário, espelha uma expressão patológica (Gonçalves
et Al., 2002).
No âmbito da avaliação
das narrativas, em 2004 Óscar Gonçalves, em conjunto com outros investigadores,
elaboraram um estudo com vista a investigar o perfil narrativo em indivíduos
com síndrome de Williams, visto que o estudo deste síndrome configura-se como
uma temática de interesse na investigação de Óscar Gonçalves. E, com tal
estudo, concluíram que as narrativas dos sujeitos com este síndrome revelam que
existem profundos deficits em termos de produção narrativa, havendo, contudo, a
preservação de alguns marcadores sociais (Gonçalves Et Al., 2004).
Direcionando o foco para
as neurociências, percebe-se que Óscar Gonçalves considera que estas são um
complemento para a psicologia e psicoterapia, pois segundo o seu ponto de
vista, “a psicoterapia ganha imenso com a aproximação às neurociências”
(Henriques, 2011). Então, para começar, Óscar Gonçalves
estabelece uma comparação entre a psicoterapia e a fisioterapia para explicar
que é necessário ter a capacidade de perceber o que está mal para recuperar
funcionalmente o cliente de uma forma o mais específica possível. Para tal, é
necessário ter um maior conhecimento acerca da patofisiologia e as implicações
inerentes à recuperação funcional psicológica (Henriques, 2011).
Posto isto, Óscar Gonçalves explica que as neurociências assumem um papel
preponderante na medida em que o avanço das mesmas pretende mostrar de que
forma a funcionalidade psicológica altera a matéria biológica. Para tal é
importante utilizar o psicológico, o comportamento, a cognição e os seus
diversos processos cognitivos com a finalidade de produzir plasticidade nos
sistemas neurobiológicos. Assim, verifica-se a formação de uma espécie de
aliança, capaz de unir as neurociências ao modelo psicológico e ao modelo
social com o objetivo de mostrar a eficácia que os mesmos provocam na mudança
dos processos neurobiológicos através do psicológico (Henriques, 2011).
Segundo espelham as
anteriores linhas, Óscar Gonçalves destaca-se em diversas áreas, da terapia
comportamental, passando pela psicoterapia narrativa e pelas neurociências,
acumulando as colaborações com laboratórios bem como universidades
internacionais e, ainda, a função de docente. Contudo, Óscar Gonçalves
autointitula-se psicólogo, clínico e psicoterapeuta.
Referências
Bibliográficas
Fernandes, E.
Gonçalves, O. (2001). Encontro das narrativas terapêuticas. Revista nacional de
psicologia clínica e da saúde. Vol1 1º pp. 53-72.
Gonçalves, O.
(1990). Terapia comportamental Modelos teóricos e manuais terapêuticos. 1ª
Edição. Edições Jornal de Psicologia, Porto.
Gonçalves, O.
Henriques, M. Cardoso, G. (2001). Manual de avaliação da estrutura e coerência
narrativa. Departamento de psicologia, Universidade do Minho.
Gonçalves, O.
Henriques, M. Soares, L. Monteiro, A. (2002). Manual de avaliação do conteúdo e
multiplicidade de narrativa. Departamento de psicologia, Universidade do Minho.
Gonçalves, O. Perez, A.
Henriques, M. Prieto, M. Lima, M. Siebert, M. Sousa, N. (2004). Funcionamento
Cognitivo e Produção Narrativa no Síndrome de Williams: Congruências ou
Dissociação Neurocognitiva? International
Journal of Clinical and Health Psychology ISSN 1697-2600. Vol. 4, Nº 3,
pp.623-638.
Henriques, A. (2011).
Entrevista concedida à Sociedade Portuguesa de Psicoterapias Construtivistas. Retirada
de:
Sem comentários:
Enviar um comentário